SOCIEDADE EM MOVIMENTO OU
REVOLUÇÃO BURGUESA EM CURSO? EDUCAÇÃO, CIVILIZAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO CAPITALISTA
NO INTERIOR PAULISTA.
Marcelo
Augusto Totti (Unesp/Marília – )
Palavras chaves: modernização, ciência,
interior paulista.
Introdução
Uma das características
inerentes da sociedade capitalista é sua capacidade de mudança, de
transformação, desde os primórdios da revolução industrial até os dias atuais o
sistema capitalista consegue transfigurar-se, reinventar-se de forma constante
e rápida conforme constatou o velho Marx (1998, p.734): “a velocidade das
mudanças na composição orgânica do capital e na sua forma técnica e no número
crescente de ramos de produção é assustador”. O pensador alemão observou as
mudanças do seu tempo ao considerar o desenvolvimento industrial nos
séculos XVIII e XIX “avançam com rapidez” (idem, p.732). Marx destaca essa
característica como algo muito singular no capitalismo, sua capacidade de
movimento, transformação, inovação, mudanças que dão sobrevida e novos
contornos a esse modo de produção.
O
capitalismo tupiniquim, por assim dizer, não foge a regra e é permeado de
mudanças e constantes transformações. O que pretendemos neste trabalho é
analisar as formas de implementação capitalista no interior paulista, com
especial destaque a educação na cidade de São Manuel localizada na Cuesta de Botucatu nos três primeiros
decênios do século passado.
Tomaremos
como referência a obra de Pierre Monbeig,
Fazendeiros e Pioneiros de São Paulo, que analisa as mudanças ocorridas no
interior paulista através da introdução do trabalho imigrante, o desbravamento
das matas em busca da chamada terra roxa,
a abertura de estradas de ferro, todo esse movimento possibilitou uma nova
etapa na fase de desenvolvimento paulista. Porém, discutiremos esse processo
descrito por Monbeig à luz das reflexões de Florestan Fernandes, sob outro
olhar, o sociólogo uspiano encara o mesmo fenômeno como um processo de
revolução burguesa em curso e atrela a educação a esse fator sem encará-la com a
mesma pujança demonstrada pelo desenvolvimento sócio-cultural do período.
Às análises das fontes da
história da educação em São Manuel, dos jornais, almanaques e fotografias
corroboram em boa medida com as teses de Florestan, demonstrando que a educação
não conseguiu atender as exigências de uma sociedade em mudança, ficando presa
a padrões estáticos de desenvolvimento.
Sociedade
em movimento e povoamento do interior paulista
Monbeig (1984) procura
demonstrar que o processo de povoamento do oeste paulista intensificado pela
expansão cafeeira modificou as condições de desenvolvimento, a rapidez, o
dinamismo com que se processou, modernizou a chamada zona
pioneira de 70 anos em 5. Essas condições foram alcançadas devido ao
desbravamento dos imigrantes, que com o bandeirantismo desmatou florestas e
criou núcleos de povoamento ainda inabitados.
Esses
núcleos de povoamento foram possíveis devido à expansão do plantio café, como
se sabe, essa expansão se deu com maior intensidade no vale do rio Paraíba do
Sul, apesar de incerta e instável lhe rendendo a denominação de “franja
pioneira”, caracterização que encaixa-se adequadamente na região da Cuesta de Botucatu.
O
movimento de expansão dos cafezais rumo a região da Cuesta de Botucatu ocorreu em função da crise econômica e da
superprodução que assolou a monocultura do café no início do século. Apesar do
atraso, a expansão foi muito promissora com produção de 45 milhões de arrobas
de café no seu início, aumentando rapidamente, considerando o munícipio de São
Manuel seu aumento foi de 151.000 para 1.592.105 de arrobas de café, sendo um
dos rendimentos mais altos do Estado. (MONBEIG, 1984).
A
terra roxa fértil que em outras regiões
não tinha a mesma juventude das plantações da Cuesta e as condições climáticas garantiam uma melhor produção que
outras regiões, esse aspecto é fundamental para o desenvolvimento das estradas
de ferro, que apesar de disputas políticas retardarem a chegada da ferrovia,
isso não demorou a acontecer. No ano de 1889, a companhia Sorocabana de
Estradas e Ferro chegaria a Botucatu e a companhia Ituana com a navegação
instalaria uma pequena linha local até os cafezais de São Manuel, o que
“durante muito tempo, essa combinação rio-trilho foi o único meio de atingir
São Manuel, de onde ia-se a cavalo a Lençóis” (MONBEIG, 1984, p.176).
Estação
de São Manuel construída em 1889.
Fonte:
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A construção da estação de trem
deu grande impulso ao povoamento da cidade de São Manuel, “ao approximarem-se
de São Manoel os comboios da Sorocabana, surge os olhos deslumbrados do
forasteiro com a maravilhosa cidade” (CALDEIRA, 1928, p.18). Aqui é possível
observar que o contingente de pessoas que vêm a cidade não é pequeno
ocasionando “metarmorphoses constantes e notabilíssimas” (idem, p.16).
Essas
transformações ao qual o autor se refere são indubitáveis a cidade, junto com a
estrada de ferro e o povoamento, São Manuel começa adquirir contornos de uma
cidade moderna para o período, ali são construídas a primeira subdelegacia, o
cemitério municipal, o paço municipal, instala-se cartório, os hotéis Paulista
e Sandroni, além de armazéns, alfaiates, matadouro, mercado municipal e casa de
cambio. Em 1904 São Manuel já contava com água encana e serviço de correio
surgem também profissionais liberais como advogados para oferecer seus serviços,
toda essa gama de atividades considerando uma cidade com “19 ruas... 9
parallelas e 10 perpendiculares” (OLIVEIRA, 1904, s.n.).
A
transformação é notável ao analisarmos as fotos abaixo das principais ruas de
São Manuel:
Avenida
Irmãs Cintra- em 1903
Fonte:
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Na figura abaixo temos a
Avenida Irmãs Cintra sem calçamento, pouco povoado e com quase nenhum comércio.
Na figura abaixo, passado 7 anos observamos a rua Floriano Peixoto, a paisagem
é distinta da figura anterior com calçamento, luz elétrica, o teatro municipal
ao lado um comércio e o hotel Volpini, a rua toda está praticamente habitada
com fachadas de alvenaria denotando o que Monbeig (1984, p. 361) chamou de
“vizinhança da casa burguesa, de estilo moderno, ‘futurista’”
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Esse seria um grande o esforço
da urbanização “as ruas começam a ser pavimentadas, orladas de passeios,
providas de esgotos, melhora o serviço de eletricidade; arruma-se o jardim
público” (MONBEIG, 1984, p.361). A estação de trem possibilitou o processo de
urbanização da cidade de São Manuel, ao seu entorno a cidade vai constituindo
com uma estrutura sólida capaz de atender as necessidades de quem ali vivia.
Isso permitiu a implantação de uma indústria incipiente que em conjunto com as
profissões liberais representavam a segunda parcela em arrecadação de impostos
do município (CALDEIRA, 1928).
Devido ao aumento rápido da
população outras demandas começam a surgir e esse tom de desenvolvimento
meramente econômico ganha outros contornos sociais, culturais, políticos que
dão o tom do processo de implementação capitalista no interior capitalista,
onde o “habitat burguês e proletário são mal diferenciados e coexistem tanto
nas ruas mercantis, quanto nas imediações da estação” (MONBEIG, 1984, p.361),
transfigurando uma suposta democracia e diversidade vivida naquele instante. A
escola emerge em meio a essas demandas da população e dentro do processo
desenvolvimento de urbanização descrito acima. Todavia, a escola contribui como
partícipe desse processo de modernização em São Manuel? Estaria ela atendendo
aos anseios de uma sociedade em mudança? Pretendemos discorrer um pouco mais
sobre esse processo a seguir:
Escola,
educação e padrões de sociabilidade em São Manuel
A primeira escola de São Manuel
é o grupo escola “Dr. Augusto Reis” fundado em 16 de fevereiro de 1900, até os
anos 1930 era única escola de São Manuel, apesar de encontrarmos registros nos
anos 1920 de escolas isoladas em alguns distritos com 20 a 50 alunos, pela
análise das fontes (OLVEIRA, 1904, CALEDIRA, 1928) essas escolas isoladas
funcionavam com um único professor de uma forma um tanto livre, pois não há
registro nos jornais, almanaques de estruturas institucionais dessas escolas,
apenas citação de professores que se empenhavam de forma abnegada com o intuito
de ensinar.
Esse fato é importante, pois o
grupo escolar “Dr. Augusto Reis” é uma das primeiras construções e nasce como
fruto do processo de urbanização e povoamento da cidade, na figura abaixo
podemos observar que a escola é construída ainda em meio as ruas sem calçamento
e como o único prédio da quadra, o que nos leva entender que a escola era
considerada um símbolo de modernidade e de grande relevância para a
cidade.
Porém, apesar da importância
atribuída à escola no início do século, nos parece que a educação não
acompanhou esse ritmo de desenvolvimento da cidade, ocorreu um enorme vácuo de
tempo na construção de escolas, a escola normal de São Manuel só será
inaugurada nos anos 1930 ficando mais de 30 anos sem a construção de alguma
escola no munícipio.
Por sua vez, a
referência à escola era feita nos jornais locais, o Movimento notícia a existência de vagas abertas para o grupo
escolar e exalta a qualidade do grupo escolar que havia até então “fornecidos
alumnos para as escholas complementares de Piracicaba e Itapetininga” (O
MOVIMENTO, 1903, p.2). Após tecer comentários e fornecer informações sobre os
horários de aulas, frequência, refeições e higiene, o jornal escreve sobre as
finalidades dos grupos escolares: “acabar com creanças mal creadas” (O
MOVIMENTO, 1903, p.2).
O
período é bem descritivo quanto aos objetivos a serem alcançados pelo grupo
escolar, “imaginae os grupos escholares conseguem o seu desinteratum: meninos
calados, cabisbaixos, sisudos e com os olhos para o chão” e o tom de controle
deve ser acompanhado de ‘nenhum choro, nenhum grito” (O MOVIMENTO, 1903, p.3).
Mas adiante, o jornal trata com resignação essas finalidades descritas, em
seguida destaca que “lá no céo sim, que é bom, creanças aos milhares, pulando,
gritando, brincando pedidno mammadeira, doces e bananas, teteias, polichenelos
e bonecas!”.(O MOVIMENTO, 1903,p.3)
O
Movimento faz uma crítica ao modelo de educação dos grupos escolares, de
proximidade com uma instituição de correção do que educacional. A crítica do
jornal vai ao encontro do que era considerada cultural infantil, de como ela era
vista fora da escola e não e não absorvida pela mesma.
Continuando com sua critica, o
jornal retrata a figura do Diretor da escola comparado-o com o porteiro do céu,
simbolicamente ilustra a figura do Diretor como carrasco, da escola como prisão
e do porteiro do céu com a liberdade e a compreensão e faz a descrição do
Diretor como um indivíduo corretor “com uma régua na preta na mão” exigindo
crianças “limpas, de barrigas cheias, horas certas, corretas e com modos de
gente grande” (O MOVIMENTO, 1903, p.3) e a figura do porteiro do céu
completamente oposta. Apesar de a crítica ser um tanto maniqueísta, mas é
salutar do que o Movimento considerava a
escola como um lugar perverso e extremamente controlador;
“Pois, sim, vai-se ninando: os meus filhos
irão ao Século XXI descalços, unhas grandes, atrasados, com fome e feios... E
se quiserem assim. Não fui eu que inventei escholas, não, senhoras. Quem tiver
obrigação que embale o Mateus.” (O MOVIMENTO, 1903, p.3)
Mesmo com as críticas, o jornal não desconsidera
a escola como elemento importante, questionava os valores nela sedimentados e o
sentido controlador que procurava impregnar e transformar a criança em um
adulto em miniatura.
Em uma revista denominada A Escola de 1903, destinado ao público infantil, mas com uma linguagem rebuscada e
difícil compreensão com as crianças como: “a sciencia infantil é muito limitada
quanto a complexidade dos phenômenos, mas é riquíssima quanto a observação dos
factos” (A ESCOLA, 1903, p.1) corrobora a crítica de o Município quanto a tentativa do grupo escolar transformar a criança
em um adulto em miniatura e demonstra o quão distante a escola estava do
público infantil ao adotar essa linguagem abstrata, verbalista, incompreensível
aos olhos de uma criança.
A
ideia da educação como forma de socialização do indivíduo também se fazem
presentes na revista, ao comentar os avanços da instrução pública em São Paulo
e salientar que a escola aboliu os castigos físicos e que agora o amor
adentrava na escola, mas que era necessário ir além do amor, do aprender a ler
e escrever, era preciso desenvolver os “aspectos physicos, intellectual e
moral” (A ESCOLA, 1903, p.1)
Para
desenvolver esses aspectos a instrução cívica destinava-se a formar o cidadão
“dando-lhes regras de conducta, firmes e seguras para se dirigir na vida
pública”. (idem). A civilidade é outro elemento marcante na revista entendida
como regras de conduta social capaz de estabelecer laços de sociabilidade,
respeito, subserviência e ordenamento social,
“a civilidade produz a boa intelligência
em particular, a paz e a ordem em geral, porque ela tira sua origem num
sentimento dum coração bem formado, dentre os quaes podemos lembrar o respeito
aos superiores, a benevolência com os iguaes e a indugelncia para com os
inferiores” (A ESCOLA, 1904, p.6)
A ideia de uma educação voltada
para a regulação social é nítida, a grande preocupação da escola é orientar o
indivíduo, socializar, integrar esse indivíduo ao seio da sociedade, sem ter
uma noção de qual sociedade ou estratos social o individuo será inserido. Em
outro jornal dos anos 1930, O Normalista,
esse discurso de finalidades educacionais se mantêm, apesar de criticar e
tentar mostrar o seu caráter de diálogo com as tendências modernas em educação,
adere à prerrogativa que a educação deve um instrumento de adaptação ao meio
social,
com dialecta abstrusa, com seu
espiritualismo retrógado, a férula dos idos tempos que nada de útil realizava a
escola. Ainda bem que os pedagogos de agora, depois de muito perlustrarem
pratica e theoricamente os problemas do ensino inferiram a finalidade ideologica
da escola, de contínuo aperpheiçoamento do sêr, de adaptação, constante e
progressiva ao meio social (O NORMALISTA, 1936, p.1)
Apesar desse suposto diálogo
com as tendências modernas em educação, o
Normalista também salienta uma adaptação os ditames sociais. Outro aspecto
relevante dessa premissa é a introdução das aulas de educação física na escola
normal.
Fonte: http://dudelamonica.blogspot.com.br
Vale destacar, que os
exercícios de educação física fora introduzida através da Reforma Francisco
Campos em 1931, como obrigatória todos os dias e duração de 30 a 45 minutos,
pois tratava-se de um projeto político mais amplo e intervencionista do governo
Vargas e passava pelo apoio dos militares que tinham o intuito do
disciplinamento e segurança nacional (HORTA, 1994).
Dessa
forma, pudemos analisar que mediante as finalidades, os objetivos educacionais,
a escola em São Manuel teve um cunho normalizador, com sentidos socializantes
de integrar o individuo a sociedade, de moralizar a criança. Cremos que esses
aspectos educativos prescritos durante os 3 primeiros decênios do século do
passado em São Manuel dão mostras de que a educação passou por poucas mudanças
e teve um diálogo restrito ou inexistente com a cultura moderna, ou a própria
cidade moderna que florescia no período.
Educação,
modernidade e revolução burguesa no interior paulista.
Cecília
Hanna Mate ao discutir a modernidade na educação aponta alguns projetos que
foram essenciais nos anos 1920, projetos estes, que tiveram figuras marcantes
como Fernando de Azevedo e Lourenço Filho e buscavam um diálogo de reeducação
com a sociedade, dos quais a “técnica e a ciência foram ingredientes
constitutivos” (MATE, 2002, p. 17).
O
que percebemos nas análises das fontes em São Manuel é ausência de qualquer
discurso científico ou de métodos de ensino utilizados na escola que
forneceriam os instrumentos para a aquisição do conhecimento. O discurso
reinante nas fontes é doutrinador e moralizador com um único intuito de adaptar
o indivíduo ao meio social. Entendendo a noção de modernidade nos anos 1920 sob
o prisma de Mate (2002, p.24) “diríamos que as definições de modernização da
escola feitas naquele período, como a introdução de técnicas e técnicos
especializados em aspectos determinados da aprendizagem/escolaridade”, não
foram feitas, pensadas ou discutidas em São Manuel, nas fontes em questão, o
elemento fundante de racionalização do tempo dentro da instituição escolar que
não pode ser desprezado como uma mera forma de organização burocrática e sim de
resultados de gradativos de disciplinarização dos corpos.
Mediante
a restrição de elementos de modernidade na educação em São Manuel, podemos
entender o fenômeno dentro do desenvolvimento autárquico-burguês. Florestan
Fernandes entedia o tema da modernidade no Brasil dentro de um quadro mais
amplo da sociedade de classes, da revolução burguesa e do desenvolvimento do
capitalismo no Brasil.
Para
Florestan, no final do século XIX e até o período militar (1964-1985) se
processo o desenvolvimento do capitalismo. Esse processo ocorreu de modo
dissociado entre dominação burguesa e processo democrático “resultante da forma típica de acumulação de capital
nos quadros do capitalismo periférico e dependente” (RODRIGUES, 2010, p.
80-grifos do autor).
Esse
processo desarticulado garante o processo originário de acumulação de capital
conciliando formas antigas e modernas na sociedade, pois é dessa ambiguidade se
dá o processo de acumulação que financia a burguesia e seu processo de
modernização da sociedade, priorizando determinado setores, como a indústria, a
tecnologia, que possibilitaram manter seu padrão de acumulação. Esse modelo de
desenvolvimento fez coexistir dois modos distintos de vida social, o arcaico e
o moderno, mas com privilégio, sem universalizar a igualdade, “segregando os
tempos da modernidade social, econômica e política, privatizando o poder
político” (idem).
Neste
contexto, Florestan aponta para uma revolução burguesa em curso, onde o
desenvolvimento autocrático passou por um processo de modernização e que
marcaram as formas de dominação do desenvolvimento capitalista. Por sua vez, a
educação não acompanhou os avanços obtidos com o regime republicano e
manteve-se em uma estrutura obsoleta incapaz de atender as necessidade de uma
sociedade em mudança. Para ele, em que consistia o dilema educacional
brasileiro:
Como herança do antigo sistema
escravocrata e senhoril, recebemos uma situação dependente inalterável na
economia mundial, instituições políticas fundadas na dominação patrimonialista
e concepções de liderança que convertiam a educação sistemática em símbolo
social dos privilégios e do poder dos membros das camadas dominantes
(FERNANDES, 1959, p.54)
Essa herança da educação
enquanto privilégio e status social dificultou um avanço da escola enquanto
função equalizadora e de capacidade de estabelecer padrões mínimos de
socialização. Além disso, ocasionou um dos problemas mais graves na formação
dos professores: “a preparação científica dos educadores se ressente de caráter
predominantes ‘informativo’ e livresco. Em regra, falta-lhes domínio autêntico
do ponto de vista científico” (FERNANDES, 1959, p.35).
Uma das soluções apontadas pelo
autor é “adaptar a educação aos recursos fornecidos pela ciência e às exigências
da civilização científica representa a tarefa de maior urgência e gravidade”
(idem), ou seja, colocar a educação na rota da modernidade seria introduzir a
ciência no sistema educacional e adaptá-la aos padrões civilizatórios em
questão.
Considerações
finais
Sociedade
em movimento ou revolução burguesa em curso? Essa pergunta do título do
presente trabalho nos fez refletir sobre ambos os conceitos e entendê-los a luz
do desenvolvimento capitalista nos anos 1920 como não sendo excludentes e sim
complementares, as fontes indicam que a cidade de São Manuel passou por um
processo de modernização e ao mesmo de implementação do capitalismo gerando uma
gama de serviços essenciais que podemos considerar como um processo de
revolução burguesa em curso, modernização da cidade, a urbanização faziam parte
de garantias civis e sociais que possibilitadas pelo desenvolvimento
capitalismo autárquico.
Ao
mesmo tempo, as fontes indicam que a educação não acompanhou esse ritmo
impresso pela sociedade, depois da inauguração da escola “Dr. Augusto Reis”
passaram mais de 30 anos sem a construção de uma nova escola, apenas com
escolas isoladas sem prerrogativas institucionais, funcionando através da
abnegação de professores, fato esse que coaduna com as teses de Florestan de um
modelo de desenvolvimento autárquico que não colocou a educação popular como
fator relevante.
Outro
fator analisado nas fontes é referente às finalidades escolares, o papel do
grupo escolar como elemento de socialização metódica do indivíduo é patente nas
fontes. Essa característica não é proeminente para considerar a educação do
município de São Manuel na rota da modernidade, pois fatores como inovação,
ciência que eram características inerentes à modernidade no período e que não
estavam presentes nas fontes em questão. Entendemos, assim, que a enquanto a sociedade passou por um
processo de modernização a educação ficou estática, preso a um modelo de
educação anterior tanto em métodos escolares pouco exposto nas fontes como em
número de escolas construídas.
Referências
A ESCOLA, São Manoel do Paraízo,
1904.
CALDEIRA,
João Netto. As nossas riquezas:
Munícipio de São Manoel São Paulo: Empreza Comercial e de Propaganda, 1928.
FERNANDES,
Florestan. A ciência aplicada e a educação como fatores de mudança cultural
provocada. Revista Brasileira de Estudos
Pedagógicos, Rio de Janeiro,v. 32, n.75, julho/setembro, 1959.
FERNANDES,
Florestan. Mudanças sociais no Brasil.
4ª edição, São Paulo: Global, 2008.
HORTA,
José Silvério Baía. O hino, o sermão e a
ordem do dia: a educação no Brasil (1930-1945). Rio de Janeiro: UFRJ, 1994.
MARX,
Karl. O capital: Critica da economia
política, livro 1, volume 2. 16ª edição, Rio de Janeiro: 1998.
MATE,
Cecília Hanna. Tempos modernos na escola.
Os anos 30 e a racionalização da educação brasileira. Bauru: Edusc; Brasília:
Inep, 2002.
MONBEIG.
Pierre. Pioneiros e fazendeiros de São
Paulo. São Paulo: Hucitec; Polis, 1984.
OLIVEIRA,
Antônio Marques. Almanack ilustrado:
São Manoel do Paraízo. São Manoel: Typographia d’ Município, 1904.
O MOVIMENTO, São Manuel, 1903.
O NORMALISTA, São Manuel, 1936.
RODRIGUES,
Lidiane Soares. Florestan Fernandes:
interlúdio (1969-1983). São Paulo: Fapesp; Hucitec, 2010.
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