26/11/2015

SÃO MANUEL 1906 - ATENTADO CONTRA A IMPRENSA LOCAL:

Escrever sobre a história de nosso município pode traduzir acontecimentos que por vezes estão velados, esquecidos. O papel do historiador é levantar estes acontecimentos para que todos tenham a real dimensão de como se construiu o local. A trama abaixo revela algo que parece mais roteiro de escritor, no entanto foram acontecimentos reais embarcados em muita discórdia e violência, protagonizados pelas autoridades locais.  
Havia em posse de pessoas influentes documentos que atestavam a falta de idoneidade e incapacidade moral de uma autoridade conceituada da sociedade. Com medo de que tais fossem parar na imprensa começa uma caça infalível pelo delegado local Antonio Marques de Oliveira com o fundamento resgata-los e destruí-los.
Primeiro o delegado julgou que tais documentos estavam em poder do Sr. Reynaldo C. Pinto Ferraz que era empregado da empresa Antonio Martins & Cia. Assim na noite de 11 de fevereiro de 1906 o delegado mandou um grupo de cinco pessoas dentre eles um desordeiro conhecido como Adolpho Gordo a casa de seu Reynaldo onde foi arrancado de sua casa e a “bordoadas” o levado a cadeia publica onde o delegado o ameaçou de morte bem como Antonio Martins e Dr. Luiz Assunção entre outras pessoas se a matéria fosse publicada pelo jornal local.
O senhor Coronel Joaquim Floriano de Toledo vendo as irregularidades do delegado procurou o Juiz de Direito na época Alberto Fausto para por fim a aquela irregularidade, aprisionando pessoa sem fim algum, o que aconteceu e o Sr. Reynaldo foi liberado.
No entanto, o delegado com o intuito de intimidação para que tais documentos fossem entregues e destruídos e deduzindo que tais estavam em posse do senhor Godofredo Wilken, que era chefe redator do Jornal o Município, ou do senhor Antonio Martins pediu para que seus capangas provocassem o senhor Godofredo passando em frente de sua casa a todo instante.
Tais abusos se elevaram com a saída do Juiz de Direito Alberto Fausto da comarca de São Manuel, assim o delegado resolveu redobrar as agressões.

Na noite de 3 de abril alguns indivíduos invadiram a sede do Club Literário e Recreativo Dois de Abril a qual seu Godofredo era presidente danificando todos os móveis, jogando e pisoteando as prateleiras de livros ali existentes, quebrando os quadros de seus presidentes, causando um prejuízo de 535$000. Os bens danificados elencados pelos peritos Constantino Kemp e Pedro Jorge foram dois quadros de litogravura, um espelho grande, uma mesa redonda grande com os pés quebrados, uma arandela de piano, quadros com os retratos de seus ex-presidentes Dr. Pereira de Rezende e o Senhor Flaminio Ferreira, oito cadeiras austríacas cortadas a faca, uma mesa de bilhar com o pano cortada a faca, uma estante armário com um vidro quebrado, diversos livros danificados.
O Jornal o Commercio de São Paulo na data de 29 de Abril de 1906, através de carta aberta do senhor Godofredo sobre os fatos descreve: “Outro não foi o fim desse attentado senão um insulto covarde a minha pessoa como poderão testemunhar todos que habitam São Manuel. Accresce ainda que, a despeito das providencias solicitada, nada fez a polícia enquanto os autores do arrombamento do Club ostentavam publicamente o seu crime.”.
A sanha de vingança e ódio do delegado foi crescendo e se acumulando na noite de 22 de abril quando terminou a apresentação do circo de cavalinhos em São Manuel indivíduos armados que faziam arruaça na frente do mesmo esperaram e agrediram o senhor Juvenal Ramos quando passava pela ponte conseguindo fugir porque seus amigos o cercaram e lhe protegeram, inclusive o senhor Lazaro de Camargo que o defendeu. Juvenal foi perseguido porque enviou um telegrama para São Paulo sobre os fatos.
Na madrugada do dia 23 de abril um grupo de mais de cinquenta pessoas arrombaram o Hotel Paulista com o intuito de assassinarem os senhores Lazaro de Camargo e o senhor Juvenal Ramos, este segundo após as agressões se refugiou no local, não os encontrando. O delegado e o alferes da força policial
foram chamados para a ocorrência do arrombamento a dona do hotel textualmente dizia que entre as vozes reconheceu a de Adolpho Gordo “o delegado exclamou a senhora, naturalmente esta enganada, pois ele podia estar aqui. Neste ínterim acudiu o alferes; não, Senhor .dr. o Adolpho estava presente.” (Jornal o Movimento 10 de maio de 1906). Ocorre que após o fato do hotel o delegado ao invés de manter a ordem disse ao alferes que recolhesse a força policial ao quartel e tranquilamente recolheu-se a residência.
Após o fato do Hotel o grupo sai do local e se dirige a sede do Jornal o Movimento jornal este dirigido por Godofredo Wilken, proferindo pelas ruas insultos a este bradando em alta voz “morras ao Movimento e a Antonio Martins”. A casa comercial de Antonio ficava de fronte ao Jornal, enquanto os manifestantes baderneiros andavam eram dados tiros ao alto, “Este acto continuo, dirigiu-se para a Rua do Commercio, e parando em frente á redacção do O Movimento,praticou ahi toda a sorte de selvagerias, que a nossa penna não pode descrever. Nem vozear tumultuoso, qual oceano esbravecido, os amotinados proferiram contra o digno redator desta folha, os doestos mais pesados, as offensas mais aviltantes, as palavras mais injuriosas que so aqui silenciamos, devido ao decoro que tributamos ao publico.”. O grupo ao chegar na sede do jornal e residência do Sr Godofredo, batia com paus na porta do mesmo, gritando “morras, devemos matar este miserável”. Seu Godofredo, vendo aquela situação apavorante e tentando salvar sua vida teve a ideia de correr e se esconder no fundo de seu quintal, permanecendo ali por um bom tempo, dando a impressão que não havia ninguém na casa, foi o que salvou sua vida.

Nas ruas continuavam os baderneiros dando tiros ao alto e ainda gritando vivas ao Dr. Jaguaribe e morte ao Jornal o Movimento. Não houve em momento algum intervenção da policia.
Assim frente a perseguição sofrida, a cidade sem Juiz sem alguém para recorrer, Godofredo suspendeu a publicação do Jornal o Movimento e resolveu embarcar para São Paulo. Na estação as 19 horas do outro dia esperando o trem, chega o Sr. Vereador Victorino B. Junior que declarou que havia um grupo de bandidos preparados para invadir sua casa e assassiná-lo.
Nesta ocasião os amigos do jornalista Joaquim Floriano de Toledo, Emiliano Baptista Soares, Lupercio de Teixeira de Camargo, João Paulo Correia de Oliveira, Osório Pimentel, Erasmo de Oliveira, Durval Fortes e muitos outros se propuseram em protegê-lo.
 O Jornal O Movimento reiniciou suas atividades posteriormente lançando seu exemplar em 10 de maio de 1906, relatando entre outras informações do ocorrido a demissão do delegado Antonio Marques de Oliveira sendo nomeado o delegado Augusto Leite para fazer a sindicância e apuração. No entanto o delegado foi superficial em sua conduta, ainda refaz o jornal que o Chefe da Policia do Estado Dr. Augusto Meirelles Reis era o primeiro interessado em ocultar os fatos: “Mas, sendo o dr Meirelles Reis, o primeiro interessado em occultar as arbitrariedades do ex-delegado, o que importa em manter aqui seu predomínio nefasto, não é para admirar que o 2º delegado auxiliar houvesse, desde que aqui chegou, assegurado que a polícia procurara em manter a ordem.”
No inicio do mês de maio de 1906 o primeiro suplente do Delegado Augusto Leite, o senhor Olegário Fortes, compadre e amigo do antigo delegado exonerado Antonio Marques de Oliveira, estava de prontidão para executar a prisão do senhor Lazaro de Camargo, conhecido como Lazinho, este era aquele que escapou da tentativa de homicídio no caso do arrombamento do Hotel Paulista.
Olegário Fortes no dia 6 de maio as quatro horas da manhã requisitou ao alferes Symphronio que era comandante do destacamento uma força para proceder a prisão de Lazinho, o alferes não atendeu a solicitação e pediu que Olegário requisitasse ao Sargento o destacamento local. Assim Olegário sem o apoio policial juntamente com o carcereiro Chiquito e João Evangelista, este segundo que era conhecido como baderneiro e assassino de Candinho Vitoriano na cidade de Jau e mais um grupo de “capangas”, foram a saída da cidade na direção onde se localizava a fazenda do Senhor Caetano de Mello, sabia-se que Lazinho se encontrava enfermo neste local. Os soldados ficaram a espreita esperando que passasse o procurado, no momento que passou o Senhor Arthur Camargo que se dirigia ao sitio onde lhe foi dado a voz de parada para a averiguação como o procurado não estava liberaram o moço para seguir caminho. Logo após passava pelo caminho Lazinho “que caiu por terra com a cabeça varada por um tiro de carabina.” Mataram-no. Os policiais alegaram que ao dar voz de prisão a vitima sacou de sua garrucha e atirou o que não foi comprovado como verdade, no entanto, apresentaram a tal garrucha com dois tiro deflagrados. “Lazinho foi morto covardemente. Elle foi a victma escolhida para desabafar as paixões mesquinhas da gente do dr. Meirelles Reis, paixões essas que se exaltaram com a demissão do bacharel Marques de Oliveira.”. A pericia constatou que o tiro que matou Lázaro de Camargo “entrou pelo lado direito, junto a parte inferior do pavilhão da orelha” e saiu na parte superior do osso esquerdo perto da tempora esquerda. Sendo assim a vitima recebeu o tiro de lado de baixo para cima, quando passava, quem atirou em Lazaro estava de joelho ou abaixado.
O Jornal O Município fez a matéria sobre o assunto com o titulo: “Crime Barbaro a Victima – Policia que assassina, responsabilidade dos autores do crime”.
Na ocasião dos fatos nada foi apurado, o dr Augusto Meirellis Reis deixa a Chefia de Policia e volta a ser Juiz. E ficou por isso mesmo.
Dr Godofredo Wilken era medico, casado com a senhora Elvira Sampaio Gomes Wilken, pai de Ruth Sampaio Wilken veio morar em São Manuel no ano de 1902 onde assumiu a direção do Jornal o Movimento, participou da construção e foi medico da Casa Pia São Vicente de Paula em São Manuel, foi presidente do Clube Recreativo de São Manuel, eleito vereador no ano de 1908 no município.
Na revolução de 1932 assumiu o corpo clinico como diretor do Hospital e Maternidade da Cruz Azul, onde prestava socorro aos soldados constitucionalistas, este hospital ajudou a angariar fundos para sua construção.
Em 1937 já era 1º tenente oficial da Força Publica do Estado de São Paulo, comemorava seu aniversário na data de 8 de novembro.