24/11/2015

A MENINA EDITHE LOURENÇO


Incrível como conservara a candura ao longo dos anos. Impressionante como os olhos ternos passaram sempre as mesmas mensagens de afeto. Sabia amar incondicionalmente, como as crianças amam descomplicadamente!
 Como toda menina moça de sua época, Edithe frequentava o patronato de moças na cidade de São Manuel. Afinal, moças precisavam aprender a bordar, pintar, e agregar beleza e capricho no dia à dia de uma casa. Edithe ia e vinha todos os dias de trem. Rotina de alegrias e sonhos.
Entretanto, num dia pré determinado pela vida, no ano de 1940, aos 13 anos, a menina moça teve seus sonhos roubados por obscuras forças que a dominaram. O seu ser já não mais comandava as próprias vontades!
Contam os mais antigos, que na guardiã de lendas ouviu cascos de cavalo galopando freneticamente, adentrando as nossas ruas, e um belo homem, morador da boa vista bradava ao vento: "cadê o Zé? Cadê o Zé? O bicho da boa vista está com a filha dele agora!
O Zé, era o pai de Edithe. E o homem a cavalo era seu irmão Lázaro.
Logo em seguida, Edithe desembarcava na estação de Alfredo Guedes, muito confusa e histérica, amparada por um responsável do patronato de moças. E naquele momento, chegaram ás vozes, chegaram as visões e se foram os sonhos de menina! Erguia-se ali, o castelo de medo e mistério.
Nunca se soube como lázaro teve conhecimento antecipado dos estranhos males de Edithe. À época, vivia ele na fazenda boa vista, não haveria como saber... No entanto, ele anunciou o que estava por acontecer.
Então iniciara-se junto com essa fusão de dimensões, a extensa lista de promessas feitas e cumpridas em favor da saúde física e espiritual da meiga menina.
Sempre doce, autêntica e simples, era extremamente solícita e amável! Amava, e muito, e muito parecidas com as mudança dos ventos, de tempos em tempos vinham as crises. Sorrateiras como as tormentas que se formam devagar, inteligentes e imprevisíveis como as serpentes! E posicionavam-se demolindo as esperanças e o entusiasmo. E o medo imperava. E do medo alimentavam-se as tormentas!
 Tudo corria bem, e de repente algo no ar se transformava em prenúncio de um estranho silêncio. Alucinante e ensurdecedor! A tristeza e o medo se faziam presentes no lindo semblante da menina, e ela recolhia-se em seu quarto escuro. Silêncio total na casa. Tudo quieto aguardando uma explosão que certamente aconteceria. Ela já não se alimentava, seu olhar não era mais seu, um estado de letargia e ausência se apoderava de seu ser. E depois de alguns dias, ouvia-se um choro agudo que crescia na casa. Ao final do fôlego, já soava como uivo. Longo, e triste. Seguiam-se os gritos e todos corriam para segurá-la! E protegê-la de si mesma! E ouviam-se frases desconexas!
Durante toda sua vida fora assim, fases e ciclos como a lua!
 E assim caminhara até a vida adulta! Meiga, inteligente, calma, mas, transformando-se de modo surreal em sua evolução.
Nunca, nunca mesmo perdera a mansidão do olhar e o sorriso de criança, seu aroma surreal, seu perfume mágico, seu cheiro de Lourenço ainda passeiam pelos seus pertences e guardados.
Não há mais choro, se foram os uivos ensurdecedores, acabaram o medo e a escuridão! Fez-se claridade dourada para finalmente viver os seus sonhos de menina moça, daqui, levara as recordações do patronato antes do fatídico dia e um lindo terço com grandes contas transparentes e num lindo jardim, depois de regar as rosas plantadas por sua mãe, depois de sonhar acordada divagando com a revista Cinelândia na memória, Edithe sorri, borda e desenha seus planos para o futuro, faz as artes que aprendera no antigo patronato. Alegra-se pelo passar do tempo que é tão lento para ela.

O sol começa a se esconder e se faz imenso rastro de luzes coloridas no horizonte. Ela se coloca de joelhos com o terço de contas transparentes dançando entre os dedos delicados, não para prometer nada, mas para cumprir os agradecimentos pelas antigas promessas feitas à nossa senhora! Está enfim liberta dos males obscuros, sua mãe celestial ouvira as suas preces e as de sua mãe Lazinha... E Edithe sorri refeita em plenitude! Agora é feliz!

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